domingo, 15 de agosto de 2010

O poder pela rua



O calçadão de Quarteira, depois do banho de multidão das marchas populares de Junho, foi palco da edição laranja das mesmas, de nome deslocado - o Pontal -, com o propósito de mostrar um PSD de retoma aos líderes mais próximos das bases.

A forte componente populista do PSD marcou presença, ladeados de mais três mil companheiros que deram o tom desejado por Mendes Bota, que havia rematado a metáfora: “não ser a rua um apanágio da esquerda”.

O líder regional e a sua equipa, galvanizados pela especificidade do momento político, não se pouparam em esforços para montar um ambiente de calor à volta do chefe, fechando o ciclo da ostracização e de uma nova era de reconhecimentos, obviamente traduzido em cargos.

Passos Coelho terá registado o desagravo de engasgos antigos, teve o seu primeiro banho de beijos e abraços no calor da noite algarvia e passou ao que vinha: desenrolar um discurso político virado para a estratégia de poder, para uma plateia órfã e sequiosa.

A anteceder o prato forte, badalou Mendes Bota, na sua traça eufórica e visionária e de novo de bem com o seu umbigo, bradando por antecipação, vivas ao futuro primeiro-ministro, falou da sua paixão pela regionalização e deixou no saco, um dos temas mais quentes dos últimos tempos – as portagens na Via do Infante.

Passos Coelho, o adorado líder que não conseguiu arrastar consigo nenhum dos pesos pesados do partido, que as hostes vêem a segurar a espada que cortará o jejum e abrirá o caminho do poder, nada disse sobre os avales passados ao Governo minoritário do PS e atreveu-se, num desplante valorizado pelo pedido de desculpas de troca-tintas, a dar-lhes um ultimato: “não contém com ele para assinar o OE de 2011, se este pensar em aumentar impostos e não reduzir a despesa”.

O mote para as próximas disputas políticas está dado, num aparente divórcio entre as duas principais mãos que produziram a mais grave crise social e económica do país e planearam o saque sobre o produto do trabalho e regalias sociais do povo português.

Crê este senhor que o altar o espera, alimentado pela fabricação de sondagens e putrefacção dos adversários, por uma Presidência da república amarrada e acalentado por 3 mil seguidores de rua, que o povo português vai fechar os olhos às suas responsabilidades na crise em que o mergulharam e que, inevitavelmente, o conteúdo das suas propostas agudizarão ainda de forma mais drástica.

PS e PSD, com o apoio dos sucessivos parlamentos, dividiram a governação do país até ao descalabro, malbarataram os dividendos da destruição da economia ordenada pela UE e as suas receitas, lançando as bases do endividamento e do desemprego, da destruição do sistema de saúde, do ensino e da Justiça, e foram julgados por cerca de 300 mil trabalhadores que saíram à rua a 29 de Maio.

Reclama o PSD o poder com 3 mil comensais ao relento estival e porque razão se perdeu a força de 300 mil portugueses que protestaram na rua, reclamando por políticas diferentes das que foram praticadas? Quem se afirma de esquerda e foge à continuação por outros meios, da utilização desta força para exigir as mudanças necessárias?

Não há ilusões que não se desvaneçam e regime que dure para sempre.


Luis Alexandre

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