quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Reflexões sobre a República


Nas etapas do centenário da República e na monarquia precedente, a burguesia dominante e lúcida, passou sempre o poder aos seus novos sectores emergentes. As cisões desenvolveram-se no seu seio em volta de novos conceitos de governação e novas ambições de poder, na linha histórica do essencial do mundo conhecido.

A monarquia, a I República e o Estado Novo, conduziram o país à mais profunda degradação social, económica e financeira, sempre pelos mesmos objectivos, a necessidade de alimentar o sistema de exploração do homem e do seu trabalho, para gáudio da burguesia que, detentora do aparelho de Estado, luta pela prioridade de o preservar.

Quando as condições de coexistência das facções na esfera do poder se mostram insanáveis, os interesses populares atingiram o estado da miserabilidade, sendo as suas aspirações, presa fácil na arregimentação para darem o corpo às balas.

O golpe de estado de 74, assentou nas mesmas razões de desalinhamento de uma parte do poder quanto à governação do Estado, da gestão dos seus interesses ultramarinos e construção de uma nova estratégia de neo-colonização, já empreendida por outras potências. Nunca os interesses populares estiveram na ordem do golpe, havendo apenas intenção de reabertura à legalização partidária.

Os limites incontroláveis do descontentamento popular frustraram a transição do poder, com a emergência de uma parte esclarecida e organizada da população, que tendo instado as massas a manifestarem-se nas ruas, acrescentaram novas exigências para o palco do poder e das políticas a adoptarem.

A III República nasceu com a luta de classes ao rubro e uma enorme instabilidade nas elites, viveu as mesmas ameaças da intervenção estrangeira da queda da monarquia, preferindo as classes dominantes dos países da NATO e da OCDE, numa percepção de que nada estava perdido, darem espaço e tempo à reorganização da burguesia portuguesa.

A tentativa de golpe de estado de 25 de Novembro de 75, organizada pelo PCP, foi o rude golpe no movimento popular revolucionário, provocando o seu fraccionamento e marcando a viragem para a galopada de recuperação do grande capital e dos seus partidos.

Trinta e seis anos depois do 25 de Abril e cem da implantação da República, os traços comuns da sociedade são evidentes: um país falido na gestão política, uma nação à mercê das exigências externas e um povo desprotegido e sem direcção para alterar a nova tragédia.

Na agonia da monarquia conduzida pelo rotativismo dos partidos Renovador e Progressista, de realçar a similaridade com a democracia parlamentar burguesa actual, onde os dois principais partidos “se davam bem, distribuindo previamente os deputados e trocando votos nas eleições”.

Passado e presente voltam a confundir-se nos meios e nos fins, com a actualização de Portugal ter mais uma obediência externa – a União Europeia -, que depois de comprar a nossa destruição produtiva, ensombra a execução do país com a dimensão da dívida e do seu serviço.

As comemorações da República, em ano de centenário, fizeram-se sobre brasas e numa escala de desorientação política sobre o futuro, com os partidos mais preocupados com os seus posicionamentos na luta pelo poder do que com as consequências das políticas recessivas que decidiram.

Numa afirmação de classe, o 5 de Outubro de 2010, primou pela troca de apelos de unidade das facções da burguesia dominante, operadas pelo Presidente e primeiro-ministro, que encontrem uma base conjuntural e não trespassem para o entendimento popular, quaisquer sinais de perda de controlo da situação.

Numa demonstração de força ideológica dos valores do Estado burguês, depois da intencionalidade da direcção psiquiátrica das discursatas, a propaganda centrou-se nos valores do capitalismo benemérito, com a inauguração de um centro avançado de investigação pago com o suor dos milhares de trabalhadores explorados nos negócios do fascista Champalimaud.

A monarquia, a I República e o Estado Novo afundaram-se na mesma podridão que agora se procura esconder.

A pátria republicana, apesar de um século de vida, continuará em convulsão, pelo regime opressor que a sustenta.

Luis Alexandre

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